1
Apenas uma palavra
que já era o silêncio.
II
Quando olhamos as primeiras estrelas
poderemos ser mais que a noite?
III
O anel débil. Deixa que a tua mão se feche.
Hás-de receber apenas um segredo que para ti se torne circular.
IV
Sabes como descansa
a noite no teu sono.
V
Os olhos procuravam a mesma luz que nos vinhas entregar,
apenas um desvio de ti mesmo para seres a transparência.
VI
É ao longo dos remos
que te visita a água.
VII
O que vem do fogo é tudo o que esperamos
para que só a cinza o possa receber.
VIII
Estão serenas as fohas
a que levamos o vento.
IX
Devagar caminhas para a casa
de que, sozinho, eras o limiar.
X
Alguém regressa como se apenas sentisse a proximidade da noite
ao esperarmos o que nas tuas mãos era ainda a mesma sombra.
XI
As folhas não se movem.
É o vento
que faz estremecer o nosso olhar.
XII
Esperas receber os frutos
de que se alimenta a árvore.
XIII
Ao conheceres um rosto
vês a hesitação da luz.
XIV
Podes ver num recorte do ar
onde está a folha ausente.
XV
Deixaram ali as folhas, abandonadas;
Não existem sequer. Alguém as vem pensar.
XVI
Agora o que nos fere é como o vento nas árvores: poderiamos
encontrar junto delas a mesma cicatriz que fosse o seu rumor?
XVII
Observas na parede
a fenda que a sustenta.
XVIII
Diante de ti um fruto, mas não havia nele um centro quaquer.
Este existe na árvore.
XIX
Um ninho que era de ar
como a respiração.
XX
Espelho: pode faltar ainda
um olhar à imagem de quem nos vê?
XXI
Sobre a colina,
um rosto da terra.
XXII
Um voo principia e reconheces
como fica alta a imobilidade.
XXIII
Junto a cada janela existe a transparência
do que mais tarde nela se principia a ver.
XXIV
Ocultar as vestes,
mas com a nudez.
XXV
Nada sabes dos montes para onde caminhas,
mas só como a planicie te pode conhecer.
XXVI
Agora sabemos como desceram as raízes
para que sejas tu sozinho a ver a árvore.
XXVII
A água que se derrama
ao esquecer o vidro.
XXVIII
Chegaste sozinho junto de uma ponte
e assim há-de ficar completo o seu arco.
XXIX
Sabias ao olhar para uma veia
como pôde a nudez estremecer.
XXX
A nuvem que procuras
até ser o nosso vento.
XXXI
Ao chegar a morte
o ar respira ainda.
XXXII
Deixaremos assim inclinado o nosso corpo
para que se veja nele a sombra do teu repouso.
XXXIII
É nos frutos que existe
o gesto para o escolher.
XXXIV
Estás imóvel,
para assim conheceres
apenas o caminho que regressa.
XXXV
É esta página quem lê nos teus olhos.
II
Quando olhamos as primeiras estrelas
poderemos ser mais que a noite?
III
O anel débil. Deixa que a tua mão se feche.
Hás-de receber apenas um segredo que para ti se torne circular.
IV
Sabes como descansa
a noite no teu sono.
V
Os olhos procuravam a mesma luz que nos vinhas entregar,
apenas um desvio de ti mesmo para seres a transparência.
VI
É ao longo dos remos
que te visita a água.
VII
O que vem do fogo é tudo o que esperamos
para que só a cinza o possa receber.
VIII
Estão serenas as fohas
a que levamos o vento.
IX
Devagar caminhas para a casa
de que, sozinho, eras o limiar.
X
Alguém regressa como se apenas sentisse a proximidade da noite
ao esperarmos o que nas tuas mãos era ainda a mesma sombra.
XI
As folhas não se movem.
É o vento
que faz estremecer o nosso olhar.
XII
Esperas receber os frutos
de que se alimenta a árvore.
XIII
Ao conheceres um rosto
vês a hesitação da luz.
XIV
Podes ver num recorte do ar
onde está a folha ausente.
XV
Deixaram ali as folhas, abandonadas;
Não existem sequer. Alguém as vem pensar.
XVI
Agora o que nos fere é como o vento nas árvores: poderiamos
encontrar junto delas a mesma cicatriz que fosse o seu rumor?
XVII
Observas na parede
a fenda que a sustenta.
XVIII
Diante de ti um fruto, mas não havia nele um centro quaquer.
Este existe na árvore.
XIX
Um ninho que era de ar
como a respiração.
XX
Espelho: pode faltar ainda
um olhar à imagem de quem nos vê?
XXI
Sobre a colina,
um rosto da terra.
XXII
Um voo principia e reconheces
como fica alta a imobilidade.
XXIII
Junto a cada janela existe a transparência
do que mais tarde nela se principia a ver.
XXIV
Ocultar as vestes,
mas com a nudez.
XXV
Nada sabes dos montes para onde caminhas,
mas só como a planicie te pode conhecer.
XXVI
Agora sabemos como desceram as raízes
para que sejas tu sozinho a ver a árvore.
XXVII
A água que se derrama
ao esquecer o vidro.
XXVIII
Chegaste sozinho junto de uma ponte
e assim há-de ficar completo o seu arco.
XXIX
Sabias ao olhar para uma veia
como pôde a nudez estremecer.
XXX
A nuvem que procuras
até ser o nosso vento.
XXXI
Ao chegar a morte
o ar respira ainda.
XXXII
Deixaremos assim inclinado o nosso corpo
para que se veja nele a sombra do teu repouso.
XXXIII
É nos frutos que existe
o gesto para o escolher.
XXXIV
Estás imóvel,
para assim conheceres
apenas o caminho que regressa.
XXXV
É esta página quem lê nos teus olhos.
in O ANEL DÉBIL (1992)
www.bibliothequeduvalais.blogspot.com tem 1 exemplar disponivel fora de catálogo, 10 €
para adquirir ou saber mais sobre a obra deverá contactar voarnapoesiablog@gmail.com
www.bibliothequeduvalais.blogspot.com tem 1 exemplar disponivel fora de catálogo, 10 €
para adquirir ou saber mais sobre a obra deverá contactar voarnapoesiablog@gmail.com
Fernando Guimarães nasceu no Porto em 1928. Tem-se notabilizado
como poeta, ensaísta e tradutor. A sua obra poética encontra-se reunida nos
seguintes livros: Casa: o seu Desenho, IN-CM, 1985;
Poesias Completas, vol. I: 1952-1988, Edições Afrontamento, 1994; A
Analogia das Folhas, ed. Limiar, 1990; O Anel Débil, Edições
Afrontamento, 1992. A sua obra ensaística orienta-se para o estudo de questões
teóricas, ligadas à estética, e da evolução da poesia portuguesa nos últimos cem
anos, a partir de grandes movimentos como o Simbolismo, o Saudosismo ou o
Modernismo. Nestes dois domínios publicou: A Poesia da "Presença" e o
Aparecimento do Neo-Realismo, Ed. Brasília; Linguagem e Ideologia,
ed. Lello; Simbolismo, Modernismo e Vanguardas, ed. Lello; Poética do
Saudosismo, ed. Presença; A Poesia Portuguesa Contemporânea e o Fim do
Modernismo, Editorial Caminho; Poética do Simbolismo em Portugal,
IN-CM; Conhecimento e Poesia, ed. Oficina Musical; Os Problemas da
Modernidade, ed. Presença. É também autor de um livro de narrativas: As
Quatro Idades, ed. Presença, 1996. Traduziu, em livro, poemas de Byron,
Shelley, Keats, Dylon Thomas e, em colaboração com Maria de Lourdes Guimarães,
Hugo von Hofmannsthal e Elaine Feinstein.
Robert Bréchon (em Georges Le Gentil, La Littérature
Portugaise) refere-se à sua obra poética nestes termos: «Il chante à
mi-voix, avec une ardeur contenue, l'intimité du jour et de la nuit, des saisons
et des heures, des fleures et des corps. Mais ce chant si simple a quelque chose
de secret, en raison de ce que Rémy Hourcade appelle les "glissements
métaphysiques" et les autres "procédés très stricts", qui constituent toute une
savante rhétorique».
in Projecto Vercial
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