A doce habitação do Eden viçoso,
onde um momento se firmou teu sólio
perdeste para sempre; errante e triste,
foste habitar nos bosques solitários,
5 das estações ludíbrio, horror da terra,
que indócil o teu braço, entre os abrolhos
te deu apenas mísero sustento,
que disputaste às rebeladas feras.
Foi tua dita efémera sòmente:
10 qual costuma nascer na primavera
resplandecente o sol, risonho o dia,
que súbito negrume em nuvem densa
rouba ao sol o clarão e a paz aos ares,
tal o destino do mortal primeiro:
5 nascendo, viu a luz serêna e pura;
viu-a no berço e túmulo num ponto;
e tanto pode em nós inda seu crime,
que temos por herança o mal e a morte
Foi para nós destêrro o que era pátria;
10 a um dia d'ouro séculos de ferro
se viram suceder, fechada noute,
profunda escuridão pousou na terra.
De mistura co'as feras alimárias,
o rei da criação nos bosques vive,
15 estado insocial, embora aclame
teus falsos bens quimérica igualdade.
O sábio hípocondríaco eloquente,
que os homens aborrece, os homens busca,
que anela os bosques só e estima a côrte,
20 que adora a solidão, mártir da glória,
se ele comigo nas agrestes margens
do Amazonas medonho os homens vira,
nus, sem cultura, bárbaros, sem pátria,
então chamara a liberdade sua
25 mais dura inda que o cárcere e que os ferros,
e só menos cruel que jugo injusto
qu'êsses, que êle ilustrou, cobardes sofrem.
Pelo vasto sertão sem lares giram,
quais feras brutas só que o pasto buscam
30 nos lacerados membros palpitantes
de seus mesmos iguais; e, de assustada,
doce mãe Natureza os olhos tapa.
A fome atroz e a gula à vida cevam.
Amortecida a luz do entendimento,
o débil, maquinal, confuso instinto,
5 contra a injúria do ar lhe ensina apenas
a mal vestir enregelados membros
de hirsutas peles de animais que matam.
Gente errante, infeliz, não sente apêgo
à terra em que nasceu, repousa e dorme,
10 onde a seus olhos se esvaece o dia,
e, quási um tronco, a outro corpo encosta.
Se o Sol, surgindo c'os ardentes raios,
toca os olhos ao bárbaro, desperta.
Ora um tigre veloz o despedaça,
15 ora êle, se mais pode, afoga um tigre.
Não s'ouve um pranto, lágrimas não correm
(feudo que à morte e à dor paga a ternura),
quando a Parca lhe corta o fio extrêmo.
O cavador esquálido na terra
20 jaz, ou no ventre de esfaimado abutre.
Nenhuma pia mão seus olhos fecha,
nenhuma bôca os últimos suspiros
lhe toma e lhe conserva; assim nos bosques
viveram meus iguais, e ainda hoje vivem
25 muitos que esconde a América opulenta.
JOSÉ AGOSTINHO DE MACEDO, A Meditação, Lisboa, 1812, págs. 23-25.
in POETAS DO SÉCULO XVIII (ÁRCADES E PRE-ROMÂNTICOS) Rodrigues LAPA (1941)
www.bibliothequeduvalais.blogspot.com tem 1 exemplar disponivel de POETAS DO SÉCULO XVIII (ÁRCADES E PRE-ROMÂNTICOS) Rodrigues LAPA (1941) (10 €), para adquiri ou saber mais sobre a obra, mencione a intenção em comentários.
José Agostinho 
de Macedo (1761 - 
1831)
O 
FRADE
O P.e José Agostinho, 
que assinava José Agostinho de Macedo (certamente por achar que o sobrenome lhe 
daria mais prestígio), foi um personagem interessante no virar do sec. XVIII 
para o sec. XIX, que muito escreveu e sobre quem também muito se escreveu. Homem 
de feitio truculento, vaidoso a mais não poder, dotado de inteligência arguta, 
mas sobretudo de uma memória verdadeiramente excepcional, cruzou-se na vida com 
quem lhe era superior, numa e noutra, e isso produziu ondas de choque que se 
sentiram por toda Lisboa. Foi o caso da sua relação com o poeta Bocage, de quem 
foi amigo, companheiro de paródia e, mais tarde, inimigo figadal. Se a fama dos 
dois andou a par, já o talento poético de Bocage deixa os pobres versos de 
Macedo a anos luz de distância. 
Viveu ele também em 
tempos conturbados da história nacional, na época das invasões francesas, do 
domínio inglês, da revolução liberal e da contra-revolução miguelista. Era muito 
difícil ter uma vida pacífica naquela época. 
Como acima referi, José 
Agostinho de Macedo escreveu muito. É um autor que faz a felicidade dos 
bibliófilos: o Dicionário de Inocêncio Francisco da Silva indica 302 obras, 
muitas desdobradas em várias edições. Infelizmente, a quantidade não é 
acompanhada da qualidade. 
Nasceu ele na cidade de 
Beja em 11 de Setembro de 1761, sendo filho do ourives Francisco José Tegueira e 
de sua esposa, Angélica dos Serafins Freire. Ainda criança, foi mandado por seu 
pai para Lisboa, para casa de um seu amigo ourives. Frequentou a instrução das 
primeiras letras e, aos onze anos, matriculou-se nas aulas da Congregação do 
Oratório na Casa de Nossa Senhora das Necessidades. Frequentou com 
aproveitamento as aulas de gramática e língua latina do Padre José de Azevedo e, 
mais tarde, os estudos de filosofia racional e moral do padre Joaquim de Foyos. 
Após os estudos 
preparatórios, tomou o hábito dos Eremitas de Santo Agostinho, no Convento de 
Nossa Senhora da Graça, em finais de 1777 ou princípios de 1778. Dizia ele mais 
tarde que fora para frade contrariado, e constrangido por seu pai. Mas pode 
muito bem não ter qualquer fundo de verdade.  Professou a 15 de Novembro de 
1778, ou seja, aos dezasseis anos de idade, com o nome de Fr. José de Santo 
Agostinho. 
A vida pacífica e 
regrada dos conventos dificilmente se poderia conciliar com o carácter 
turbulento, a vaidade e a índole caprichosa de Agostinho. Depressa se distinguiu 
pelas suas leviandades e traquinices. Certa noite, véspera da festa de Santo 
Agostinho, ele e mais outros frades da sua idade, decidiram assaltar a dispensa 
e comer umas lampreias que os veteranos do Convento haviam recebido como 
presente do Colégio de Coimbra para celebrar à mesa a festa do Santo. A proeza 
valeu a cada um dos intervenientes oito dias de rigoroso jejum a pão e água. 
José Agostinho foi transferido de Lisboa para Coimbra a fim de seguir o curso de 
Teologia. 
Não ficou muito tempo em 
Coimbra. Deverá ter feito mais alguma, porque em 1782, foi transferido para o 
convento de Nossa Senhora do Pópulo, em Braga. Alguns meses depois, dava entrada 
no cárcere do convento, por tropelia que fizera; nada contente com o castigo, 
empreendeu a fuga do convento, mas não tardou a ser apanhado. Foi mandado então 
sob prisão para o Convento de S. João Novo, no cidade do Porto, sendo entregue 
ao Prior para julgamento. A 17 de Agosto de 1782, foi contra ele proferida 
sentença claustral, com penas e penitências canónicas.  Parte das penas foram 
depois comutadas, sendo ele mandado para outra casa da Ordem, esperando que se 
emendasse.  Foi para o Convento da Graça, em Évora, mas passado algum tempo 
(cerca de dois anos), também daí fugiu. Contra ele foi proferida nova sentença a 
21 de Março de 1785. 
Veio então de novo para 
o Convento de Lisboa e prosseguiu no mesmo tipo de vida. Foi acusado de 
extraviar e de vender livros do convento, onde exercia funções de bibliotecário, 
e também de viver em concubinato, com uma prostituta, Cláudia Maria Benigna 
(1788). Preso no cárcere do convento, mais uma vez fugiu, tardando desta vez em 
ser apanhado. À sua revelia, foi contra ele proferida uma sentença em 22 de 
Junho de 1788, em que ele é declarado incorrigível e digno de ser expulso da 
religião, vistas as contínuas reincidências. 
Vendo-se na iminência de 
ser expulso, José Agostinho recorreu ao Arcebispo, D. Carlos Bellisomi, Núncio 
Apostólico em Lisboa; disse estar arrependido e prometeu emendar-se; acusou os 
seus confrades de malquerenças internas. O Núncio enviou um despacho em 9 de 
Fevereiro de 1789 ao Provincial dos Agostinhos, mandando que recebesse o réu com 
caridade e só o castigasse com penas temporárias. O Provincial obedeceu e 
mandou-o para o Convento da Graça, sito em Torres Vedras. Também daqui se evadiu 
e foi parar de novo ao calabouço conventual, com vigilância mais apertada, no 
Convento da Graça, em Lisboa.  Quis então recorrer de novo ao Núncio, mas não 
foi atendido.  Enviou então uma exposição ao Ministério dos Negócios do Reino, 
queixando-se da violência que com ele usava o Provincial da Ordem. A exposição 
foi às mãos do Intendente Diogo de Pina Manique, que pediu informações ao 
Corregedor do Bairro do Rossio. 
O Intendente remeteu ao 
Ministério a sua informação dizendo “que o preso era efectivamente de conduta 
irregular e relaxada, usando de armas defesas, etc. ….. mas que tanto o 
Provincial como o Prior eram de génios ásperos em demasia, e como tais incapazes 
de governo”.
Do Governo baixou então 
em 3 de Fevereiro de 1790 um aviso da Secretaria de Estado ao Intendente, para 
que intimasse o Provincial Fr. António de Menezes a libertar o recluso, e lhe 
desse ampla liberdade para falar aos seus procuradores e amigos, sem prejuízo do 
prosseguimento da causa. 
Mais uma vez José 
Agostinho recorreu ao Núncio Apostólico e este ordenou a transferência de para o 
Mosteiro do Santíssimo Sacramento, da ordem dos monges de S. Paulo Eremita, na 
Calçada do Combro, ficando ele assim a coberto da má vontade dos seus confrades, 
os Gracianos (como eram chamados).
Por esta altura (1790), 
Joaquim Severino Ferraz de Campos e Belchior Manuel Curvo Semedo, aliados a 
Domingos Caldas Barbosa, tiveram a ideia de fundar uma academia, substituindo a 
Arcádia que se finara em 1776. Teve ela o nome de Academia das Belas Letras, de 
Lisboa. Bocage acabava de regressar da Índia e era, nessa altura, amigo e 
companheiro de borga de José Agostinho. Alistaram-se os dois na instituição, com 
os nomes de Elmano Sadino e Elmiro Tagídeo. Algumas poesias de ambos saíram 
depois nos quatro pequenos volumes do Almanach das Musas. A Academia teve 
apenas três anos e meio de existência, tendo-se finado sobretudo pela 
animosidade entre aqueles dois, como veremos adiante. 
José Agostinho era bem 
tratado pelos Paulistas, tinha acesso pleno à Biblioteca e liberdade para dali 
levar livros. Isso fê-lo cair na tentação de furtar alguns livros para os ir 
vender à rua. E tão bem se sentia, que, em Março de 1791, decidiu abandonar de 
vez o convento e vaguear pela cidade, até que a Polícia o meteu na cadeia do 
Limoeiro à ordem do Intendente. Mais uma vez, o Intendente Pina Manique o 
devolveu ao Mosteiro de S. Paulo, com uma carta para o Reitor para que lhe 
aplicasse um correctivo. 
Como a tentação era 
grande, José Agostinho reincidiu no roubo dos livros. Dando-se conta disso, o 
Reitor foi fazer queixa ao Intendente, que pôs a Polícia em campo, a qual 
depressa descobriu que a maior parte dos livros roubados estava em poder de um 
livreiro francês, estabelecido na Rua das Portas de S. Catarina. Foram logo 
apreendidos e entregues a seus donos. Foi emitido mandado de prisão contra José 
Agostinho  que, no mês de Setembro de 1791, deu entrada nas prisões do Castelo 
de S. Jorge. Em 8 de Outubro seguinte, foi mandado não já para o mosteiro de S. 
Paulo, mas para o convento da Graça, com uma carta do Intendente recomendando 
que fosse punido rigorosamente. 
Embora em prisão 
rigorosa, mesmo assim conseguiu fugir; mas não foi longe. Apanhado, foi-lhe 
movido um processo célere, de tal modo que em 7 de Dezembro de 1791, foi 
proferida contra ele uma sentença em que o declaravam contumaz e incorrigível e 
o expulsavam para sempre da Ordem a que pertencera. A sentença foi confirmada 
pelo Definitório a 23 de Dezembro. 
A 18 de Fevereiro de 
1792, foi realizada a cerimónia, em que se lhe despiu o hábito, lançando-o a 
seguir fora das portas do convento que se fecharam sobre ele. 
O 
PREGADOR
Antes de prosseguir, 
devo dizer que, nesta data, já José Agostinho deveria ter sido ordenado 
sacerdote, embora nenhum dos seus biógrafos assinale a data.  Só assim se 
compreende que ele tenha conseguido mais tarde o breve que o tornou padre 
secular.
 O nosso “herói” não se 
deixou ir abaixo com a perda do hábito de monge. Felizmente para ele na altura 
(e mesmo durante toda a sua vida), ainda tinha amigos para o ajudar. Um seu 
antigo confrade, Fr. Joaquim de Menezes e Ataíde assumiu as funções de defensor 
oficioso e com tanta eficiência que conseguiu a anulação, por motivos formais, 
da sentença proferida dentro das paredes do convento. Isso permitiu-lhe mais 
tarde solicitar autorização para exercer as funções de presbítero, como se o 
processo nunca tivesse existido. 
Fora do convento, tinha 
José Agostinho de encontrar onde ganhar o pão de cada dia. Arranjaram-lhe os 
amigos (em especial, Domingos Caldas Barbosa) um lugar de redactor no Jornal 
Encyclopedico, onde até publicou algumas poesias. Mas, passados alguns meses, 
foi despedido, possivelmente porque acabou o jornal. 
Entretanto, chegou-lhe 
de Roma o breve de secularização, seguindo-se uma sentença executorial do Bispo, 
pela qual se lhe conferia o pleno exercício das ordens sacras, devendo ele 
subscrever um termo de obediência àquele prelado, o que fez em 10 de Março de 
1794. Adoptou então publicamente o nome de José Agostinho de Macedo.
Maria Ivone de Ornellas 
de Andrade, na sua exaustiva tese de doutoramento, elenca os benfeitores de 
Macedo: 
- Fr. José Mariano da 
Conceição Veloso, Director da Imprensa Régia, que editou as suas primeiras 
obras: o 1.º volume da tradução das Odes de Horácio e dois cantos do 
poema Contemplação da Natureza;
- Monsenhor José Rebelo 
Seabra, que lhe conseguiu a nomeação como pregador régio;
- Ricardo Raimundo 
Nogueira, Conselheiro de Estado e Governador do Reino, a quem dedicou o poema 
Gama e mais tarde o Elogio Histórico;
-D. António de S. José 
de Castro, Patriarca de Lisboa. 
Nesta fase da sua vida, 
aplicou-se José Agostinho em procurar a formação literária e ideológica que lhe 
faltava; para isso, leu tudo o que lhe apareceu à mão: livros de moral, 
política, literatura, poesia, história, filosofia, tudo ele devorou e amalgamou 
na sua memória . Aperfeiçoou o seu conhecimento de línguas, até ali praticamente 
limitado ao latim, tendo feito progressos notáveis pelo menos em francês e 
italiano. 
No mister eclesiástico, 
deu conta que o melhor que se lhe adaptava e mais rendoso era a função de 
pregador e, de facto, não lhe foi difícil ganhar fama e proveito como tal. Da 
tal modo que em 1798, foi escolhido para pregar na Real Capela do Palácio de 
Queluz, nas festas do nascimento de D. Pedro. 
Embora mais tarde 
publicasse alguns sermões (Inocêncio elenca 21), eram, na sua maior parte, 
improvisados. Tinha tanta facilidade em redigir, escrevendo, como a orar, 
improvisando. Mais tarde, era vulgar proferir três, quatro e cinco sermões no 
mesmo dia.  Criado o lugar de pregador régio em 8 de Novembro de 1802, José 
Agostinho de Macedo foi o primeiro nomeado, o que não era pequena honra no meio 
lisboeta da altura.
O 
POETA
Voltemos alguns anos 
atrás. Em Agosto de 1790, desembarcou do Oriente Bocage, já afamado como poeta 
repentista. Mais ou menos na mesma altura (e a coincidência das datas pode não 
ser por acaso), um grupo de poetas ou pretendentes a isso, constituído por 
Domingos Caldas Barbosa, Belchior Manuel Curvo Semedo, Francisco Joaquim Bingre 
e Joaquim Severiano Ferraz de Campos decidiu fundar a Academia das Belas Letras 
ou Nova Arcádia, destinada a substituir a Arcádia Lusitana, que havia sido 
extinta em 1778. Foi seu protector José de Vasconcellos e Sousa, Conde de 
Pombeiro, que inclusivamente pôs à disposição as instalações para os sócios se 
reunirem. 
Aqui fica uma lista (que 
não deve ser exaustiva) dos sócios da Academia, com o respectivo nome 
artístico:
António Bersane Leite de 
Paula – Tionio
António 
Dinis da Cruz e Silva - Elpino Nonacriense
António Ribeiro dos 
Santos – Elpino Duriense
Belchior Manuel Curvo 
Semedo Torres de 
Sequeira – Belmiro 
Transtagano
Domingos Caldas Barbosa 
– Lereno Selinuntino   
Domingos 
dos Reis Quita – Alcino Mecénio
Domingos 
Maximiano Torres – Alfeno Cíntio
Francisco 
Joaquim Bingre - Francélio Vouguense - ver aqui 
uma sátira deste poeta a José Agostinho
Gastão 
Fausto da Câmara Coutinho -  Anfriso Tagitano
Inácio da 
Costa Quintela -Jacinto Ulissiponense
Inácio José de Alvarenga 
Peixoto – Alcindo Palmireno
João Baptista de Lara – 
Albano Ulissiponense
João 
Vicente Pimentel Maldonado  - Ismeno
Joaquim Franco de Araújo 
Freire Barbosa, Abade de Almoster– Corydon Neptunino
Joaquim Severino Ferraz 
de Campos –  Alcino Lisbonense  
José Agostinho de Macedo 
– Elmiro Tagídeo.
José Bersane Leite de 
Paula – Josino
José Maria da Costa e 
Silva  - Elpino Tagideu  
José 
Rodrigues Pimentel e Maia – Menalca
José Tomás da 
Silva Quintanilha – Eurindo 
Nonacriense
Luis Correa da França e 
Amaral – Meliseu Silenio
Manuel Maria Barbosa du 
Bocage – Elmano Sadino
Miguel António de Barros 
– Melibeu
Sebastião 
Xavier Botelho – Clário / Salicio 
Tomás António dos Santos 
e Silva – Setúbal  -- Tomino Sadino
As reuniões eram 
presididas por Domingos Caldas Barbosa, mulato de nascimento e já de alguma 
idade (nascera no Rio de Janeiro em 1740). Não tardou muito que Bocage começasse 
a lançar dardos com os seus poemas contra tudo e todos, a começar pelo 
Presidente:
   Preside o neto da 
rainha Ginga,
À corja vil, 
aduladora insana:
Alguns responderam-lhe e 
assim se estabeleceu uma guerra literária. Por esta altura, José Agostinho ainda 
estava calado, até porque estava ainda de boas relações com Bocage. 
Em 1801, publicou Bocage 
a tradução do poema As plantas de Ricardo Castel, juntando-lhe uma 
introdução em que, linha a linha, se auto-elogia. No grupo da Academia, escolhe 
os que lhe agradam, de quem diz bem, e fulmina todos os outros com os piores 
adjectivos. Claro que os mencionados, eram aqueles que o adulavam e lhe 
alimentavam o amor próprio. Entre os seus eleitos, Francélio, Ismeno, Jacinto, 
Clario, o jovem Menalca (tinha 20 anos), Josino e Alcino. José Agostinho ficou 
nos excluídos e não terá gostado, pois, passado pouco tempo, saiu-se com a 
sátira:
Sempre, oh Bocage, as 
sátiras serviram
Para dar nome eterno, 
e fama a um tolo:
Não era poesia muito 
inspirada, mas era ofensiva suficientemente para levar Bocage às nuvens. De 
improviso, arrasou-o com a resposta a que chamou “Pena de 
Talião”:
Refalsado animal, das 
trevas sócio,
Depõe, não vistas de 
cordeiro a pele.
………………....
Sanguessuga de pútridos autores,
………………....
A rapsódia servil, poema intruso,
Pilhagem que fizeste em mil volumes,
………………....
Mas venha o mais: epístolas, sonetos,
Odes, canções, metamorfoses, tudo . . .
Na frente põe teu nome, e estou vingado.
José Agostinho respondeu 
com uma segunda sátira, mas diz Inocêncio que, sendo ainda mais fraca que a 
primeira, não chegou a ser publicada. Na altura, a polémica ficou por ali. A 
luta era muito desigual, não pela agressividade das palavras, mas pela qualidade 
dos textos, real em Bocage, inexistente em Macedo. 
Entretanto, Bocage foi 
expulso da Academia, pois já ofendera quase todos os restantes sócios, com 
pequenas excepções. Macedo permaneceu até à sua extinção, em 1793. Dos trabalhos 
da Nova Arcádia ficaram quatro pequenos volumes com o título “Almanaque das 
Musas”, além, claro, dos livros dados à estampa pelos próprios sócios. 
Até à morte prematura de 
Bocage em 1805, este ainda lançou mais umas bicadas a Macedo:
   O tonsurado, 
retumbante Elmiro
Vibra tiros ao vate, 
e cada tiro
Mais frouxo que 
pedrada de criança. 
No final de 1804, Macedo 
escreveu um ensaio teatral, uma tragédia chamada Zaida, mal acolhida pelo 
público; Bocage puxou da pena e escreveu:
Na 
cena em quadra trágico-invernosa
Zaida 
se impingiu (fradesco drama!)
Apareceu depois, com sede à fama,
Tragédia mais igual, mais 
lastimosa:
O 
autor pranteia em frase aparatosa
Esfaqueado arrais, pimpão d'Alfama;
Corno 
o protagonista, e puta a dama,
O 
machão é Simeão, e a mula é Rosa:
Espicha o rabo (eu tremo ao 
proferi-lo)
Espicha o rabo ali o herói na rua,
Qual 
Muratão nos areais do Nilo!
Elmiro 
na tarefa continua,
Já 
todos pela escolha, e pelo estilo
Rosnam 
que a nova peça é obra sua.
Em abono da verdade, 
deve dizer-se que, à morte de Bocage (aos quarenta anos ), José Agostinho 
escreveu um comovido epicédio: 
…………………..enquanto o 
Mundo
Se 
lembrar de Camões, de Tasso, de Milton,
Lhe 
há-de lembrar também d’Elmano o Nome.
Passados sete anos, 
despertou em José Agostinho a raiva adormecida e veio de novo para a escrita 
lançar impropérios contra Bocage, em “Os burros” e nas “Considerações 
mansas sobre o quarto tomo da Obra métrica de Manuel Bocage” 
(1813).
Entretanto, José 
Agostinho não desistia da sua carreira de poeta. Tinha ele preparado uma 
tradução completa de Horácio e conseguiu que o Padre José Mariano Veloso lhe 
editasse um primeiro volume, o que aconteceu no início de 1807. A obra não foi 
bem acolhida, tanto mais que, na mesma altura, foi publicada outra tradução do 
mesmo poeta, mais perfeita,  por António Ribeiro dos Santos. O segundo volume 
não foi publicado, por falta de merecimento, embora José Agostinho afirmasse que 
o Padre Veloso havia levado para o Brasil o manuscrito quando partiu para o 
Brasil com a família real, fugindo à invasão de Junot. 
Data desta altura a 
inimizade permanente entre Agostinho e Nuno Alvares Pereira Pato Moniz, poeta 
medíocre, que escreveu longamente contra Macedo. Pato Moniz escreveu alguns 
sonetos satíricos a propósito da tradução de Horácio, e José Agostinho 
respondeu-lhe com uma longa sátira. Nunca mais se puderam ver. Mais tarde Pato 
Moniz escreveu:
- em 1815, as 355 
páginas do Exame analytico e parallelo do poema Oriente do Rdo. Jose 
Agostinho de Macedo com a Lusiada de Camoes
- em 1817 as 182 páginas 
da Agostinheida - poema heroi-comico em 9 cantos, impresso em 
Londres.
Pato Moniz parecia fazer 
da crítica a Agostinho uma profissão (mas era Secretário da Câmara Municipal de 
Lisboa). 
Durante a primeira 
invasão francesa e o governo do País por Junot, Macedo esteve mais sossegado, 
porque fazia menos sermões. Aproveitou para rever as suas obras e escrever mais 
algumas. 
Quando os franceses 
foram derrotados na Roliça e no Vimeiro e expulsos de Portugal  (mas não de mãos 
vazias), José Agostinho não parava de ser solicitado para pregar nas missas de 
acção de graças pela libertação; diz Inocêncio que ele terá proferido mais de 
quarenta “discursos gratulatórios”, de que se publicaram apenas dois. 
Por esta altura, 
publicou Agostinho “Os sebastianistas”, crença bastante espalhada por 
Lisboa. O livro, porém, era insultuoso, malcriado, inexacto, de tal modo que 
logo apareceram outros a refutar o que ele dizia. Como o tema era popular, os 
papéis vendiam-se muito bem e davam dinheiro aos seus autores. Mas Agostinho 
acabou por perder, pois diminuiu substancialmente o numero dos sermões 
encomendados, já que em muitas paróquias havia “sebastianistas” em lugares de 
influência 
O maior desplante de 
Agostinho foi o de querer suplantar Camões. Depois de vários anos de composição, 
publicou em 1811 o poema Gama, que depois transformou em Oriente 
(publicado em 1815), com o acrescento de dois cantos. Todos lhe caíram em cima, 
mas o homem não tinha emenda. 
Nesta altura (1811) 
zangou-se com o tipógrafo Desidério Marques Leão, porque este, em vez de fazer 
do Gama os 200 exemplares que tinham combinado, fez 1000. Agostinho 
exigiu-lhe quatro moedas (4 x 6$400 rs.) pelo preço do manuscrito. Marques Leão 
perdeu assim a edição do Motim Literário, com que esperava ganhar muito 
dinheiro. 
JOSÉ AGOSTINHO E 
A INQUISIÇÃO
Apesar de Macedo afirmar 
descaradamente que não tinha nenhuma queixa na Inquisição, a verdade é que teve 
quatro queixas (e não apenas duas, como dizem Inocêncio e António Baião). 
A primeira denúncia (Pr. 
N.º 6 776) foi a de Soror Mariana Faustina da Purificação, 39 anos, do 
Convento de Santa Marta, que está datada de 24 de Julho de 1804. José Agostinho 
é identificado como “Clérigo Secular, egresso da Religião dos Eremitas de Santo 
Agostinho”, morador na Rua Nova da Palma. A denunciante afirma que o Padre lhe 
dirigiu várias expressões de afecto e lhe apertou a mão, quer na grade do 
parlatório, quer uma vez no confessionário, onde foi conversar com ele, pois não 
se podia ir à grade, por estar o Sacramento exposto. 
Foram ouvidas diversas 
testemunhas, que nada disseram em desabono do Padre, e afirmaram que a freira 
sofria da cabeça. 
O próprio Comissário 
encarregado do processo, Pedro Lourenço de Seixas,  refere que a queixosa 
padecia muito da cabeça; que o acusado é pregador régio e pessoa de boa vida e 
costumes. O processo é concluso com vista ao promotor Fiscal em 3 de Outubro de 
1804 e fica por aí. 
Os processos 16 439 e 17 
071 apenas têm as denúncias, que, no entanto, são  bem mais graves que a 
anterior. 
Em 28 de Abril de 1807 a 
analfabeta Josefa Maria do Nascimento, que esteve em casa do Padre como criada 
até ao Natal de 1807, morando ele na Calçada do Forno do Tijolo, freguesia dos 
Anjos, afirmou que, estando ela de conversação com Domingas Rita Ebrard, mulher 
infamada de mancebia com o P.e José Agostinho, ele disse às duas que não havia 
inferno, que isto da formação do mundo era uma história. Que fora o confessor 
dela que a obrigara a fazer a denúncia, caso contrário, não a 
absolvia.
Na sequência desta 
denúncia, vai aos Estaus a em 9 de Maio de 1807 a Domingas Rita Ebrard, moradora 
na Calçada de S. Ana, freguesia de Nossa Senhora da Pena, no n.º 40, de 30 anos, 
casada com António Moreira Brito, Furriel do Regimento de Setúbal, a qual 
confirmou as declarações da Josefa Maria do Nascimento. Mais declarou que a 
intenção de fazer a denúncia chegou aos ouvidos do P.e José Agostinho “o qual 
ameaçou matá-la, se tal denúncia fizesse”. 
A Josefa disse que a 
Domingas era casada, mas não fazia vida e sociedade com o marido.
Estas denúncias não 
tiveram qualquer sequência, eventualmente porque foram feitas imediatamente 
antes das invasões francesas e do governo de Junot. 
Nos ficheiros da Torre 
do Tombo, consta mais uma denúncia de 1813, mas, infelizmente, o respectivo 
processo (n.º 16 012) desapareceu, como já referia Maria Ivone de Ornellas de 
Andrade. Oxalá consigam reencontrá-lo na Torre do Tombo, agora que andam a 
tentar pôr ordem nos processos da Inquisição. 
MAIS 
POLÉMICAS
Um frequente alvo das 
pedradas de José Agostinho foi o dramaturgo António Xavier Ferreira de Azevedo, 
que escrevia umas peças o melhor que podia para a actriz Mariana Torres, que era 
sua amante. José Agostinho também escrevia peças para a actriz Maria Inácia da 
Luz, com quem também tinha um caso. Eram rivais, elas e eles. 
José Agostinho 
declarou guerra de morte a António Xavier e à sua protegida. Chegou ao extremo 
de escrever uns versos obscenos com o título “Paródia do Elogio que em a noite do seu beneficio recitou 
a primeira actriz, a senhora Marianna Torres, no theatro da Rua dos 
Condes”. António Xavier tinha bom 
feitio, mas desta vez, não se ficou. Escreveu uma peça a parodiar o padre com o 
título “O mau amigo”.  O actor que fazia o papel do padre, de nome 
Caetano de Sousa, andou uns dias a seguir o padre, para copiar os seus gestos, o 
modo de se assoar, de “tomar” tabaco, etc. de modo a poder imitá-lo no palco; 
pôs assim o público a rir às gargalhadas. A peça teve um enorme sucesso.  José 
Agostinho foi fazer queixa ao Intendente da Polícia, mas este disse que, para se 
pronunciar, tinha antes de ver a peça. Mas só o fez ao fim de vinte dias, quando 
quase Lisboa inteira já a tinha visto. 
O 
Comissário da Polícia permitiu que a peça continuasse, mas exigiu que se mudasse 
o vestuário do personagem. Xavier vestiu-lhe um casaco vermelho igual ao que 
trajava um louco inofensivo da urbe lisboeta alcunhado de Pax Vobis, 
deixando outros elementos que identificavam o padre. As risadas redobraram. 
Na guerra 
contra António Xavier, Agostinho ainda recorreu mais tarde a um truque muito 
abjecto. Um dia em que pregava na Igreja Paroquial de S. Paulo, vendo António 
Xavier entre o público, virando-se para ele disse (cito Inocêncio): “Daqui 
mesmo estou vendo um ímpio, que veio a este lugar sagrado para zombar dos 
mistérios da nossa religião e do culto do Altíssimo, etc.”.  Ficaram todos 
escandalizados e a Irmandade do Santíssimo da freguesia excluiu o Padre de ali 
voltar a pregar. 
No ano de 
1812, começou José Agostinho a escrever um longo poema, onde satirizava tudo e 
todos, a que chamou Os Burros. Primeiro, teria quatro cantos, depois, 
seis e, finalmente, oito. Metia no poema toda a gente de que não gostava. Numas 
versões entravam uns, depois, noutras saíam esses e entravam outros. Há uma 
versão de 1812, outra de 1814, outra de 1823, outra de 1825 e, finalmente, uma 
final de 1827. Para Inocêncio, a obra deve ser considerada inédita, tantas as 
contrafacções que constam das três edições, duas em Paris (1827, 1835) e uma em 
Lisboa (1837).
Em 1812, 
deu ele ao prelo os poemas Newton e Meditação. Demoraram algum 
tempo a sair a público e, quando isso aconteceu, já ele preparava novas versões, 
como era seu costume. Saíram então segundas edições, respectivamente, em 1815 e 
1818. 
Uma coisa 
que nos admira e disso se admirou também Inocêncio, é como ele conseguia 
escrever tanto, quando vagueava na cidade tardes inteiras, ia aos conventos 
“namorar” as freiras, ia para o Rossio, etc. 
É José 
Agostinho que nos dá a chave do enigma:  “…e se me pergunta V. Mercê quando 
escrevo tanto, passeando sempre e buscando o pão sem dever cinco réis a ninguém, 
levando manhãs e ás vezes tardes inteiras no meu ofício, que é falar alto e bom 
som, eu lhe respondo: que gasto mais azeite, que vinho; sem consultar os médicos 
e sem ser frade capucho, posso-me levantar regularmente à meia noite e escrever 
até pela manhã, duas chávenas de bom chá compõem a minha cabeça e logram o meu 
estômago, e continuo na teima de estudar e escrever até às onze horas, quando o 
meu falar alto me não chama para a rua; janto e durmo até ás três; depois, 
Rossio e mundo e Cais do Sodré, a ouvir verdades puras e discursos 
patrióticos”.
JOSÉ AGOSTINHO DE 
MACEDO E AS MULHERES
Apesar do celibato 
eclesiástico, José Agostinho teve sempre relações íntimas com mulheres. Ainda 
frade foi acusado de viver em concubinato com Cláudia Maria Benigna, uma 
prostituta.  Teve também um caso com a Domingas Rita Ebrard, separada do marido, 
que o denunciou à Inquisição, como vimos. 
Foi depois íntimo da 
actriz Maria Inácia da Luz, na sua fase de “dramaturgo”.  Como diz Inocêncio, 
voltou-se depois do teatro para o claustro, e substituiu a actriz por uma 
religiosa Cisterciense do Mosteiro de Odivelas, D. Joana Tomásia de Brito Lobo 
de Sampaio, a quem dedicou o livro Cartas Philosóphicas a Áttico, 
impressas em 1815. Deste modo, ficou o affaire conhecido em toda Lisboa. 
Estes amores acabaram em 
1818. Foi o caso que D. Joana Tomásia se correspondia com outra religiosa da 
mesma Ordem das Bernardas, de Coz, chamada Maria Cândida do Vale; um dia, 
mostrou ao Padre uma carta dela e ele gostou do que leu.  Quando D. Maria 
Cândida veio a Lisboa, pediu-lhe uma entrevista.  A seguir, D. Maria Cândida 
abandonou o convento e veio viver com José Agostinho até à morte deste, treze 
anos depois.  Foi muito o fervor do Padre que, em poucos dias, compôs cento e um 
poemas que publicou em 1819, na Imprensa Régia, com o título de A Lyra 
Anacreôntica, a ela dedicado. 
Namorar freiras era 
ocupação típica da época, em especial dos padres; chamavam-lhes “peixe de 
grelha”, por causa das grelhas do parlatório.  José Agostinho chama-lhes 
“manas” e dizia mesmo que D. Joana era sua irmã.
O amor por D. Maria 
Cândida também arrefeceu, quando José Agostinho se embeveceu por uma freira mais 
novinha do Convento das Trinas no Rato, Soror Feliciana Rosa da Madre de Deus, 
com quem se correspondeu de Janeiro de 1820 a finais de 1822 – temos ainda hoje 
57 dessas cartas, publicadas pela Academia das Ciências. Chama-lhe “Mana e 
senhora minha”, “Mana do meu coração”e à Superiora do Convento “nossa Mãe”.  A 
partir daí, D. Maria Cândida passou a ser a “empostolenta”, a 
“emplastrada”, e a “galinha choca”. A pobre veio depois 
marcar terreno, com duas cartas que endereçou à nova rival, transcritas por 
Inocêncio; deverá tê-lo conseguido, porque o romance epistolar acabou no final 
de 1822. 
NO TEMPO DA 
REVOLUÇÃO
José Agostinho de Macedo 
gabava-se de ter sido convidado para entrar na Maçonaria, mas Inocêncio acha que 
essa é mais uma das mentiras dele. Até à revolução de 1820, nunca deixou de 
combater e escrever contra os pedreiros livres, como se dizia ao tempo. 
Onde ele quis entrar, 
foi na Academia das Ciências, sem que alguma vez o conseguisse. Disso ficou ele 
despeitado e não deixou de o escrever:
Debaixo desta pedra 
mudo e quedo
Jaz o moído e moedor 
Macedo
No mundo nada foi 
quando vivia,
Nem sócio foi da 
magra Academia. 
A 24 de Agosto de 1820, 
deu-se a revolução no Porto. José Agostinho sentiu-se um bocado desorientado. 
Por um lado, queria aproveitar a liberdade concedida pelo novo regime, por 
outro, o coração puxava-o para a defesa dos princípios absolutistas. A certa 
altura, “ameaçou” parar de escrever, como se o público fosse sentir a sua falta. 
E, na realidade, parece que assim acontecia. 
Procedia-se então às 
eleições para as Cortes. Apesar dos esforços em contrário dos seus inimigos, 
José Agostinho conseguiu  ser eleito primeiro substituto pelo círculo eleitoral 
de Portalegre com 1513 votos. Serviu-lhe de consolação, mas não chegou a pôr os 
pés no Parlamento, com grande desgosto dele. 
Em 18 de Novembro de 
1822, foi presente ao Tribunal Protector da Liberdade de Imprensa, acusado de 
abuso da liberdade de imprensa. Fora o caso que tinha escrito num artigo da 
Gazeta Universal de 28 de Março do mesmo ano, que os corcundas 
(absolutistas) professavam muitos e mui diversos ofícios, sendo uns 
sapateiros, outros alfaiates, alguns brigadeiros, outros generais, sacristães, 
coveiros, etc., enquanto que os liberais tinham todos um ofício, que era o de 
pedreiro. Naquele tempo, era grave acusar-se alguém de maçon (pedreiro 
livre), ou seja, ateu, destruidor da moral, da ordem social e do governo. O 
advogado de José Agostinho, Manuel José de Abreu Gomes Vidal, porém, fez bem o 
seu trabalho e ele acabou por ser absolvido.
Segundo diz Inocêncio, 
os liberais trataram então de o conquistar para o lado deles, “pagando” para que 
ele escrevesse alguns textos a favor do sistema constitucional. 
Em 1823 dá-se a 
Vilafrancada, e José Agostinho teve de se desculpar com os seus correligionários 
por ter posto a sua pena ao serviço do partido agora vencido. Fundou então um 
jornal estranho com o nome de Tripa virada, onde escrevia com o seu 
habitual estilo violento e virulento. De tal modo que, após serem publicados 
três números, o Ministério suspendeu o jornal. Fez sair então a Tripa por uma 
vez: livro primeiro e último.  
Em Abril de 1824 foi 
nomeado pelo Arcebispo – Vigário-Geral do Patriarcado, D. António José Ferreira 
de Sousa, censor do Ordinário de todas as publicações, vindas do estrangeiro e 
traduzidas. Como era seu costume, escreveu muito e à vontade, falando de tudo e 
não apenas dos livros em apreciação. Foram essas censuras publicadas em 1901 
pela Academia das Ciências de Lisboa. 
Faleceu D. João VI em 10 
de Março de 1826 e José Agostinho foi escolhido para pregar nas solenes exéquias 
do real defunto, que se fizeram um mês depois. Deste sermão, tirou ele um lucro 
apreciável pois foi-lhe atribuída uma pensão anual de 300$000 rs. que ficou a 
receber até ao fim da sua vida. Esta pensão foi obtida pela intervenção do Dr. 
Abrantes, médico e conselheiro real, que Agostinho (o qual detestava médicos) 
até havia insultado numa censura em 21 de Dezembro anterior.  Escrevera ele: 
“O médico Abrantes está agora benemérito das Letras, porque sábado, 17 do 
corrente, deu duas pílulas a um livreiro, e acabando a 18 de tomar a segunda, 
acabou para sempre de vender livros e lá está enterrado. Deus guarde a V. Ex.ª 
muitos anos, e o livre de tais médicos e tais livros”. Alguém remeteu a 
censura para Inglaterra e ali foi publicada no n.º 6 do Correio 
Interceptado (1826). Lá teve Agostinho de emendar a mão com um texto a que 
chamou Resposta aos collaboradores do infame papel intitulado Correio 
Interceptado, onde incluiu alguns apressados elogios ao Dr. Abrantes, seu 
benfeitor. 
Nesta altura, estava ele 
com a saúde bastante abalada, sofrendo permanentemente de gota e de cálculos na 
bexiga muito dolorosos. Tinha-se acentuado a cor avermelhada que lhe tinha 
valido a alcunha de Padre Lagosta. Desde 1822, alugara uma casa em 
Pedrouços para onde se retirava para descansar. 
Data desta época uma 
amizade grande com o s frades bernardos de Alcobaça, nomeadamente, Fr. Joaquim 
da Cruz a quem escreveu muitas dezenas de cartas  e também Fr. Fortunato de S. 
Boaventura, a quem também escrevia, chamando-o Padre Mestre Doutor. 
Em 29 de Abril de 1826, 
D. Pedro IV outorgou nova Carta Constitucional, jurada sem oposição em 31 de 
Julho seguinte.  José Agostinho iniciou uma campanha contra a Carta e contra os 
deputados através de uma série de cartas dirigidas ao seu amigo e editor Joaquim 
José Pedro Lopes, criticando o regime, os liberais e os artigos do jornal O 
Português. Foram 32 cartas publicadas mais tarde com o título de Cartas 
de José Agostinho de Macedo ao seu amigo J.J.P.L. (ao todo, 384 pags.), com 
tiragens elevadas, como refere Inocêncio.  Destas publicações, diz Inocêncio que 
ele retirou proveitos apreciáveis, ainda que, nesta altura, se tivesse tornado 
ele muito avarento e fuinha. 
Em 1828, tomou conta do 
Reino, D. Miguel, que revogou a Carta Constitucional e reinstituiu o antigo 
regime. Apesar da doença, José Agostinho encontrou a energia para iniciar outro 
jornal a que chamou A Besta esfolada, de que saíram 26 números. Era 
editor o seu amigo Fr. Joaquim da Cruz e de cada número eram impressos 4 000 
exemplares. O jornal transpirava ódio contra os liberais e contra todos os que 
eles consideravam inimigos do trono e do altar. A censura 
procurava moderar os textos, com grande raiva do autor. Em Outubro de 1829, o 
Desembargo do Paço acabou por proibir o jornal; José Agostinho demitiu-se então 
do lugar de censor. 
Apesar dos sofrimentos 
causados pela sua doença, José Agostinho continuou a escrever até ao termo da 
sua vida. A sua última empresa foi o jornal O Desengano, periódico 
político e moral, de que saíram  27 números, sendo o último póstumo.
Teve um ataque violento 
a 30 de Setembro de 1831 e faleceu na manhã de 2 de Outubro, poucos dias depois 
de completar 70 anos. 
Pelas leis vigentes na 
época, os frades egressos não podiam fazer testamento (Ordenações, Liv. 4.º, 
Tit. LXXXI, § 4.º), mas os bens que tinha ficaram para D. Maria Cândida do Vale, 
que depois regressou ao convento.
CONCLUSÃO
Que se aproveita da vida 
de José Agostinho de Macedo, para além da lista enorme das suas publicações e 
dos seus escritos, que fazem a delícia dos bibliófilos? Não muito, na verdade. 
Como pregador, o que 
era, como ele dizia, o seu ofício, procurava falar alto e em bom tom, 
aparentando convicções que, com toda a evidência, não tinha. Numa epístola 
escrita em versos hendecassílabos, dirigida em 21 de Maio de 1808 a Frei 
Francisco Freire de Carvalho, escreveu ele: 
Eu vivo, caro amigo, 
pois não morre
A 
inumerável turba dos carolas,
Encanzinados em louvar os santos, 
Que lá 
na glória repimpados jazem, 
Zangados, como eu creio, da assuada
Que 
lhe fazem de cá roucas rebecas, 
E as 
mentiras que eu prego, e mais os outros, 
Que a 
pasmada plebécula suspendem, 
Com 
frias Orações, Discursos ocos.
A sua memória prodigiosa 
e a facilidade de improvisar eram as qualidades mais importantes que lhe 
permitiram viver do seu ofício de pregar em muitas épocas da sua vida. 
Nisso tinha um orgulho e vaidade desmedidos como se vê por este trecho, parte 
final do Solilóquio LXIII, no Motim Literário, 3.º vol.: 
Outro fenómeno de 
engenho desejava eu observar na República das letras, que vem a ser um homem, 
que, consumado em estudos, e com a alma tão inundado caudaloso rio da erudição, 
tão possuidor de sua maternal linguagem, de imaginação tão fértil, e em cujo 
espírito se sucedessem tão rapidamente as ideias umas à1s outras, que sem 
nenhuma preparação prévia  sobre qualquer assunto dado de moral, e na esfera da 
religião sobre qualquer mistério, improvisasse um discurso regular, conforme as 
mais escrupulosas leis da arte de persuadir, que durasse uma hora, e acabado 
este discurso, com algum intervalo, não para meditar, mas para repousar, começar 
sobre outro assunto dado, novo discurso, que parecesse meditado, escrito, 
decorado de longo tempo. Esta maravilha nunca apareceu em França, e se viu uma 
só vez em Itália em um só discurso desta natureza improvisado por um capucho de 
barbas, chamado Serafim de Vicenza. Deram-lhe um texto ao subir do púlpito, e 
era este: Pulchritudo ejus filiæ regis ab intus, discorreu 
maravilhosamente sobre a perfeição interior do espírito: mas não se tornou a 
meter noutra, saindo-se tão bem deste primeiro ensaio. Ora este fenómeno não 
visto até agora, existe vivo, são, e robusto em um canto de Portugal, tão 
esquecido, ou tão pouco notado como se estivesse morto. Habituou-se de tal 
maneira a discorrer improvisamente, que já não pode de outra maneira discorrer 
em público. Constituída em acção, começa o discurso, e escaldando-se-lhe 
progressivamente a fantasia, vão sucedendo-se em ordem ideias sempre novas; a 
proposição ou proposições estabelecidas, são demonstradas com todo o rigor 
matemático sem secura, mas  com toda a pompa, e fertilidade da eloquência, este 
homem pára de cansado e não de exaurido, e acomodada que seja esta fervura, e 
tornando o entendimento a equilibrar-se não se lembra nem de uma só palavra que 
pronunciasse, e fica por grande espaço em tal inacção, que se assemelha à 
verdadeira estupidez; eu não sei apontar qual seja a razão desta extraordinária 
maravilha. 
Viveu numa época em que 
todo o que lia livros tinha a mania que era poeta, e por isso quis também sê-lo, 
mas a poesia dele pouco vale. 
Como pessoa, não tinha 
mesmo qualidades de carácter que o recomendassem.
Os seus contemporâneos 
são, em geral, muito severos para com ele, como, por exemplo,  José Liberato 
Freire de Carvalho, nas Memórias com o Título de Annaes para a História do 
Tempo que durou a Usurpação de D. Miguel, vol. 1.º, Lisboa, 1841. 
"No princípio do 
seguinte mês de Outubro deste ano morreu em Lisboa o padre José Agostinho de 
Macedo, de quem já falei no meu Ensaio sobre a usurpação de D. Miguel, e 
que foi uma das grandes monstruosidades do nosso tempo; porque toda a sua vida 
foi em sumo grau escândalo por sua imoralidade, hipocrisia e baixa servidão. 
Contudo, como literato pode dizer-se, que nem lhe faltaram talentos nem 
erudição, falsificando factos, persuadindo-se vaidosamente que bastava 
enunciá-los para que acreditassem. O seu estilo em prosa, mui longe de ser 
castigado e clássico, era, pelas mais das vezes, tortuoso e difuso; e no que 
mais pecou foi na falta de decência, porque em geral, era venal, baixo, 
grosseiro, e muitas vezes foi torpe e obsceno. Quis ainda passar por um dos 
nossos grandes poetas; e a sua vaidade, seu elemento essencial, até o levou a 
querer competir com Camões; mas nesta empresa teve a sorte que lhe convinha, 
porque, sem talentos poéticos para ser inventor, teve a presunção de o querer 
emendar; e assim, seguindo-o de rastos na sua marcha, verdadeiramente nova e 
sublime, mostrou ao mundo que se apenas podia passar por um bom 
versejador, era como poeta, na presença do nosso Homero, um verdadeiro 
pigmeu, cheio de altivez e arrogância.”. (pp. 101-102).extraído de www.arlindo-correia.com/180708.html

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